segunda-feira, 28 de maio de 1990

Livro: A Revolução Norte-Americana.


Obra:A REVOLUÇÃO NORTE AMERICANA.


Autor: M. J. Heale.



04 de julho de 1776.

RETROSPECTO DA REVOLUÇÃO NORTE AMERICANA.

Não houve uma Revolução Norte Americana, mas, sim, apenas um ato de secessão do Império Britânico, uma série de revoluções, política, constitucional, ideológica e social. O reconhecimento de que a Revolução Norte Americana consistiu em algo mais do que uma luta pela independência e implicou uma mudança social e política fundamental dentro dos Estados Unidos. Terá essa Constituição representado a culminância da Revolução Norte Americana. Em 1812 deflagrou-se novamente a guerra com a Grã Bretanha, e poder-se-ia dizer que o final dessa guerra, em 1815, depois de haverem os Estados Unidos demonstrado a si mesmos e ao mundo que seu novo sistema de governo resistira tanto a tensões internas quanto a ataques externos, marcava a culminância da Revolução Norte Americana, porém ela nunca terminou.

A PERSPECTIVA BRITÂNICA.

Os líderes revolucionários explicaram que havia reagido por que o governo britânico estava tentando escravizá-los. Foram as políticas e as medidas adotadas por ministros britânicos por volta de 1763 a 1775 que fizeram com que os norte americanos temessem por suas liberdades. Os norte americanos opunham-se aos impostos que os governos britânicos procuravam arrecadar deles mas esses impostos eram muito suaves em comparação aos aplicados na Grã Bretanha e o dinheiro recolhido destinava-se a pagar parte dos altos custos da defesa e da administração coloniais. A tributação não foi o único nem o maior dos temas da disputa entre a Grã Bretanha e suas colônias norte americanas no decorrer dos quinze anos que antecederam a Declaração da Independência. O atrito entre elas surgiu, pela primeira vez de maneira séria, quando os ministérios britânicos pretenderam fazer mudanças no governo e na administração do Império Britânico. Foi a adoção na década de 1760, de uma política de reorganização imperial que disparou a sequência de acontecimentos que levaram a Guerra da Independência. Uma nova política imperial tornara-se necessária em decorrência da guerra dos Sete Anos, antes dela, de várias décadas de negligência para com o Império. A vitória britânica na Guerra dos Sete Anos pode ter tornado a Grã Bretanha a maior potência mundial, mas quando George Grenville se tornou o primeiro ministro do rei, em 1763, viu-se diante de problemas quase insuperáveis: assembléias desrespeitosas, reivindicações de terras, o comércio exterior colonial, comércio de peles do interior e do Canadá. Em outubro o ministério emitiu o que ficou conhecido como a proclamação de 1763 que pretendia tanto possibilitar a administração dos novos territórios americanos quanto lidar com o problema indígena. Ao mesmo tempo que o ministério de Grenville desenvolvia seus planos de administração da América do Norte, buscava também os modos de custear as despesas que isso implicava. Em 1764, Grenville promoveu a Lei do Açúcar, ou Lei das Fazendas, medida complexa que, na verdade, reduzia a taxa sobre o melaço estrangeiro importado pelos destiladores de rum da Nova Inglaterra. Em 1775, com a Lei do Selo. Tarifas de selo vinham sendo cobradas na Inglaterra a mais de 70 anos, e o ministério desejava estender o mesmo princípio as colônias com um imposto sobre jornais, cartas de baralho, documentos legais, licença para negociar com aguardente, apólices de seguro, documentos de embarque e outros. Houve a reação colonial as diversas medidas do ministério de Grenville, em particular a Lei do Selo.

O ministério de Grenville havia sido substituído por outro, encabeçado por Lord Rockimgham (por razões sem qualquer relação com as questões americanas), e, sem condições de impor sua vontade as colônias, esse ministério conseguiu a revogação daquela lei em março de 1766. Ao mesmo tempo, no entanto, Parlamento aprovou a Lei Declaratória, que garantia o direito do Parlamento de elaborar leis para as colônias "em qualquer caso que fosse". O governo britânico abandonou assim uma medida que não podia fazer aplicar, mas não deixou de lado o princípio constitucional da soberania parlamentar. Outra mudança de governo colocou o brilhante em instável Carlos Townshend como chanceler do tesouro. Townshend determinou outra tentativa para recadar dinheiro das colônias e, com a Lei da Receita de 1767, instituiu tarifas sobre a importação colonial do chá e de muitas mercadorias manufaturadas, especialmente, vidro, tinta e papel. Townshend instituiu também, em Boston, um (Conselho Norte Americano de Comissários Alfandegários), submetido diretamente a Grã Bretanha, e permitiu que os tribunais coloniais expedissem mandatos de intervenção possibilitando que funcionários alfandegários dessem buscas em residências e depósitos. A resistência colonial as leis de Townshend desenvolveu-se mais lentamente do que ocorrera com as medidas de Grenville, nem por isso deixou de se tornar também resoluta e generalizada. Um novo governo britânico, encabeçado por Lord North, já admitira a necessidade de abandonar a política inaplicável de Townshend, que estava custando mais dinheiro do que arrecadava, e, num gesto que pretendia ser uma última concessão, o ministério revogou todas as tarifas, mantendo apenas a que recaia sobre o chá. Enquanto nas colônias, ia sendo coordenada uma oposição contra as pretensões britânicas, o ministério de North lutava com grave crise financeira na Grã Bretanha: Lei do Chá em 1773, Leis Coercitivas ou Leis Intolerantes de 1774, Lei de Quebec. Essas várias leis de 1774 pareceram a muitos norte americanos uma investida planejada contra suas liberdades.

A PERSPECTIVA NORTE AMERICANA.

Desde 1763, o empenho dos ministérios britânicos em promover a administração do Império levou-os a entrar em conflito com as colônias norte americanas. Para muitos colonos eminentes, as medidas atabalhoadas do governo britânico pareciam passos sucessivos no sentido de privá-los da liberdade, e talvez até mesmo uma conspiração planejada para acabar com a própria Constituição inglesa. Os fidalgos coloniais e as pessoas comuns frequentemente concordaram, a partir de 1763, que a Grã Bretanha ameaçava a todos os norte americanos com o que se podia chamar de escravidão. Uma das razões para a Guerra da Independência foi o malogro do governo Britânico em avaliar o grau em que os princípios constitucionais ingleses se haviam arraigado nas colônias. A herança constitucional inglesa cunha ênfase na preservação das liberdades individuais contra o poder arbitrário, a muito tempo os colonos se haviam acostumado a alimentar essa herança. O paradoxo da Revolução Norte Americana, portanto, é ter ela iniciado pela afirmação dos direitos dos ingleses natos. Com Cartas de Catão e com os Escritos de Lorde Bolingbroke, James Burgh e outros críticos do governo britânico, os revolucionários norte americanos da colônia ficaram sabendo que, na Inglaterra a ambígua Constituição estava sendo destruída pelas maquinações do rei e de seus ministros os quais estavam sabidamente aniquilando a liberdade do povo e a independência da Câmara dos Comuns, mediante a utilização de suborno e de clientelismo e pela manipulação da dívida nacional e dos impostos. Essa interpretação "ideológica", que se funda no ponto de vista mundial dos líderes coloniais e no modo como percebem os atos britânicos, representam grande passo na direção da explicação da resistência norte americana. Porém a ideologia não constitui a explicação suficiente. A resistência norte americana a política britânica deveu algo também as considerações econômicas e aos interesses, atos e crenças dos homens e mulheres comuns. A crise financeira que atingiu a Grâ Bretanha em 1772, e que levou Companhia das Índias Orientais a uma situação muito precária, resultou num colapso do crédito nas colônias, o que afetou especialmente os fazendeiros sulistas cujas operações dependiam dos créditos escocês e inglês. Os motivos econômicos ajudam a explicar o surgimento relativamente precoce do radicalismo nas mais importantes cidades norte americanas. Porém, embora os filhos da liberdade recrutassem membros de todas as camadas nas cidades e ajudassem a mobilizar a resistência contra a Grã Bretanha, não se deve exagerar o significado do radicalismo urbano.
A grande maioria dos homens brancos por todas as colônias norte americanas era de pequenos agricultores, e em sua maior parte, não estava sofrendo dificuldades econômicas. A relativa prosperidade da agricultura foi uma das razões por que os agricultores norte americanos demoraram se mais a aderir a revolta contra o rei do que os pequenos comerciantes e artífices das cidades, mas finalmente aderiram, e desse modo tornaram possível que a Guerra da Independência fosse levada a cabo com êxito. Em algumas regiões pequenos agricultores estavam indignados com os senhores locais que haviam recebido cargos, concessões de terra ou outros favores das autoridades régias, e tendiam a rebelar-se para tirarem uma desforra local em todas as colônias, muitos pequenos agricultores haviam sido atingidos pelo grande despertar religioso de meados do século XVIII, o que os levara a voltarem-se contra as hierarquias eclesiásticas tradicionais.

GUERRA DA INDEPENDÊNCIA.

Quando se reuniu o Congresso Continental, em 1775, pouco depois da batalha de Lexington, muito de seus membros ainda esperavam que as divergências entre Londres e as colônias pudessem resolver-se, era tarde demais para a reconciliação. A 17 de junho de 1775, o Congresso já decidira recrutar um exército Continental e havia nomeado George Washington como comandante chefe. Em julho, o Congresso aprovou uma Declaração das Causas para pegar em armas. O próprio rei proclamou que as colônias da América do Norte estavam em estado de rebelião. Em 1776, o Bom senso de Tom Paine, denunciava o rei como uma "besta real" e convocava os norte americanos a instituírem uma república.

Em 4 de julho de 1776, Congresso aprovou formalmente a Declaração de Independência. A conclusão foi, então, de que apenas separando-se da Grã Bretanha se asseguraria a sobrevivência daquelas liberdades que os norte americanos acreditavam ser seu direito inato. George III e seus ministros, como a maioria das pessoas na Grã Bretanha, supunham, compreensivelmente, que a vitória britânica era certa. Com tudo, em dois anos, a Grã Bretanha estava perdendo a guerra e, em 1781, a rendição do general Conwallis em Yorktown assinalou a humilhação final do poderio britânico. Seria mais exato dizer, porém, não que os Estados Unidos ganharam a guerra mas, sim, que a Grã Bretanha a perdeu. As leis coercitivas e a nomeação de Tomas Gage para governador militar de Massachusetts, em 1774, basearam-se na suposição de que Boston fosse o ponto central do descontentamento. Contudo, os cambotes de Lexington, Concord e Bunker Hill serviram para despertar o ardor rebelde dos norte americanos por todas as colônias. O êxito militar, acreditavam os britânicos tornaria possível a retomada do domínio político britânico. Foi também um engano, pois vitórias militares isoladas pouco fizeram para conquistar a afeição dos norte americanos para o rei. A canhestra invasão britânica provocou também a rebelião armada de muitos agricultores normalmente pacíficos. Quando uma jovem foi morta e escalpada por índios que lutavam ao lado dos britânicos e pareceu que Burgoyne ameaçava com outras atrocidades indígenas, mais norte americanos indignados aderiram a causa rebelde. Saratoga mudou definitivamente o curso da guerra em favor dos Estados Unidos. Consequência da maior importância foi o reconhecimento francês dos Estados Unidos e a entrada da França na guerra em 1778, como aliada dos norte americanos. Depois de Saratoga, a guerra entrou numa terceira fase na medida em que a Grã Bretanha reconheceu que apenas confrontos militares não iriam trazer a vitória.

Os Britânicos reconheceram se necessário conquistar a população civil. A Guerra da Independência Norte Americana mostrava-se prolongada, dispendiosa e inócua para o governo britânico que então se dava conta de que sua única alternativa era abandonar a tentativa de reprimir suas antigas colônias. O comércio exterior britânico fora gravemente prejudicado pela guerra, as forças armadas britânicas sofriam reveses nas mãos das potências Européias por todos os cantos do mundo, e a Grã Bretanha encontrava enormes dificuldades para governar a Irlanda e a Índia. Em fevereiro de 1783, A Câmara dos Comuns decidiu dar fim as providências militares contra os norte americanos.

AS REVOLUÇÕES DENTRO DOS ESTADOS.

Por sí só, a Guerra pode não ter sido uma revolução, e pode ter tido início como uma tentativa de defender as liberdades inglesas das usurpações dos ministros britânicos, uma vez iniciada, porém, ela acelerou o ritmo da mudança revolucionária dentro da América do Norte. As treze colônias haviam sido entidades separadas, e , muito naturalmente, os novos estados mantinham suas identidades distintas. A declaração da independência afirmava que as antigas colônias seriam "Estados Livres e Independentes", mas nada dizia sobre as suas formas de governo. A idéia de republicanismo não era até então intercambiável com a idéia de democracia, mas implicava, numa forma de governo que representasse o povo em seu conjunto e apenas o povo. Na opinião de alguns ingleses mesmo antes, da guerra da independência, as colônias norte americanas já praticavam formas de republicanismo. Enquanto os fidalgos aprovaram medidas de grande repercussão contra a tirania Britânica nas assembléias coloniais e provinciais, pessoas de categoria inferior saíram as ruas para intimidar distribuidores de selos, funcionários do rei e legalistas. Assim, havia mudanças políticas e sociais de longo alcance ocorrendo na América do Norte, mas o grau de mudança variava de um estado para outro. As novas constituições estaduais elaboradas durante aqueles anos, refletiam em si mesmas a gama de opiniões políticas sustentadas pelos norte americanos. Na Carolina do Sul e em Mariland, por exemplo, onde abastados fazendeiros haviam, por muito tempo, desfrutado considerável e influência política, as constituições procuraram limitar a participação popular mediante dispositivos, tais como a exigência de alta qualificação em termos de riqueza para concorrer a um posto, o que garantiu que as regiões conservadoras do leste, com seus grandes proprietários, fossem representadas no legislativo. Os rebeldes norte americanos tinham de assegurar-se de que o povo estivesse bem representado em suas formas de governo. Os norte americanos haviam aprendido com os radicais ingleses que "onde termina a eleição anual, começa a tirania", e procuravam evitar qualquer possibilidade de escravidão colocando governo basicamente nas mãos de organismos eleitos pelo povo a cada ano.

A REVOLUÇÃO NA NAÇÃO.

Em 1783, embora a causa da independência fizesse com que os estados soberanos procurassem a atuar conjuntamente ela também liberou grande número de pressões que levaram distintos grupos de norte americanos a se distanciarem uns dos outros. O exército continental ou no congresso ou como ministros no exterior, isso causava grande desgosto. Eles haviam desenvolvido uma visão mais grandiosa dos destinos de sua nação, e, na década de 1780, passaram a dedicar-se a tarefa de tornar a revolução um fenômeno nacional. George Washington começava a pensar em si mesmo 1º como norte americano e, em 2º como virginiano, a maioria da gente comum continuava a identificar-se com suas comunidades locais. Aqueles senhores que queriam que os Estados Unidos assumissem uma posição digna no mundo aborreciam-se também com a impotência do governo nacional. Houve uma curta depressão econômica logo depois da partida das tropas britânicas, mas os agricultores e os grandes negociantes norte americanos em breve recomeçaram a prosperar, e manufaturas foram sendo instaladas. Os fidalgos revolucionários, tinham desprezo por um futuro tão rotineiro e confuso. Queriam uma república unificada que abarcasse um continente. Queriam criar uma sociedade verdadeiramente nacional onde as distinções entre novaiorquinos, marilandeses e virginianos não mais existissem e onde as fidelidades locais e estatais estivessem subordinadas a lealdades nacionais. Percebiam que o excesso de democracia local iria, ao mesmo tempo, frustrar seus objetivos nacionais e colocar em risco suas posições pessoais. Em certo sentido, seu desejo de reconstruir o governo nacional era contra revolucionário. Nos anos que se seguiram a rendição dos britânicos em Yorktown, os senhores nacionalistas da América do Norte procuravam maneiras de fortalecer o governo central. Em 1789 uma revolução constitucional, ainda que não uma revolução social, havia se completado em escala nacional nos Estados Unidos. Devia haver um congresso com certos poderes especificados, entre os quais o direito de fixar impostos e prover a defesa nacional. Além do legislativo e do executivo, um judiciário nacional independente, encabeçado por uma corte suprema cujos membros seriam indicados pelo presidente e ratificados pelo senado, deteria a supervisão das leis. Por todo o país os senhores de mentalidade nacional, com o apoio de muitos artesãos urbanos e agricultores comerciais, tornaram-se conhecidos como federalistas, uma vez que lutavam pela constituição, enquanto os senhores de mentalidade local e muitos cidadãos do campo e pequenos agricultores do interior colaboraram com a resistência dos anti federalistas a constituição. Um novo governo nacional passou a existir em 1789, mas a maioria dos norte americanos continuou ignorando esse governo. Finalmente fora levada a cabo uma Revolução Norte Americana, isto é, uma revolução que envolvia ativamente os cidadãos comuns de todo o território em um sistema nacional de política.


Por: Prof. Vanessa.

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