O TESOURO PERDIDO DE ZULMIRO, O PIRATA IRLANDÊS QUE SE ESCONDEU NO BRASIL
Em entrevista à Aventuras na História, o curitibano Marcos Juliano Ofenbock explica como desvendou o que, até então, era uma lenda urbana
IZABEL DUVA RAPOPORT E NICOLI RAVELI PUBLICADO EM 12/04/2020
A partir do século 19, uma história repleta de rumores tomava conta da cidade de Curitiba, localizada no Paraná. De acordo com a lenda, o pirata Zulmiro era um homem irlandês que se mudou para o Brasil e escondia um baú com diversas joias em um túnel desconhecido.
Por mais que diversas pessoas tenham procurado pelo objeto, nunca o encontraram, e a história permaneceu como uma lenda urbana até pouco tempo atrás. Entretanto, após 15 anos de pesquisa, o curitibano Marcos Juliano Ofenbock, autor da obra A Verdadeira Ilha do Tesouro - As Crônicas do Pirata Zulmiro, encontrou documentos que comprovam a história do pirata e também seu paradeiro.
O pirata Zulmiro.
Em entrevista à Aventuras na História, Marcos explicou que Zulmiro veio até o Brasil a fim de se esconder. “Ele foi o último pirata do século 19, um britânico que veio se esconder no sul do Brasil há 190 anos, em Curitiba, e por lá viveu até 1889, quando morreu, aos 90 anos. Seu nome verdadeiro era Francis Hodder e ele nasceu no sul da Irlânda, em Cork (parte do Reino Unido da época), de uma família muito rica”, afirma.
Segundo os relatos do pesquisador, a paixão pela navegação começou aos 25 anos, quando o britânico entrou para a Marinha Real Inglesa. “Aos 30, ele acidentalmente matou outro oficial em uma discussão nas Ilhas das Bermudas e desertou para fugir da pena de morte da corte marcial. Então, abraçou a pirataria, abandonou sua identidade verdadeira e adotou o nome de guerra: Zulmiro”.
A trajetória até o Brasil.
Após deixar tudo para trás, sua vida não foi fácil. Ofenbock conta que, em 1831, o homem foi capturado por Keppel, comandante de um navio de guerra inglês. Entretanto, para a sua sorte, eles eram amigos de longa data, já que tiveram contato durante os serviços da Marinha Real Inglesa.
“Keppel, para não ter de enforcar o antigo amigo, simulou uma fuga do pirata no litoral sul do Brasil, na condição de que ele fosse para o interior do continente e abandonasse a vida de crimes. Zulmiro contou que, após nove dias, subiu a serra e chegou à pequena vila de Curitiba, com cerca de três mil habitantes. Lá, morou numa região afastada do centro, e os habitantes o chamavam de “velho do mato”. Ninguém sabia que ele era um pirata”, relatou o escritor.
Os documentos encontrados.
Segundo Marcos, existem diversos documentos que podem comprovar a veracidade da história. “Existem cartas escritas e publicadas em 1896 no Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, por um cidadão inglês chamado Edward Young, que conheceu o pirata Zulmiro em Curitiba entre 1879 e 1880, e eles se tornaram grandes amigos”.
Dessa maneira, o pirata contou toda a sua história para Young. Além disso, também o entregou um roteiro para encontrar o tesouro escondido na Ilha de Trindade. “Edward escreveu oito cartas e, um mês após a última carta, ladrões invadiram a casa do inglês para roubar o roteiro do tesouro e acabaram assassinando Edward”.
Foi por meio dessas cartas que Marcos conseguiu localizar o nome do pirata nos registros do cemitério municipal de Curitiba. “Ele faleceu no dia 24 de agosto de 1889 e usava o nome de João Francisco Inglez. Também consegui encontrar o pirata no livro de registros de alunos da Eton College no ano de 1811: seu nome era Francis Hodder e nasceu em Cork”. Diante diversas descobertas, a Prefeitura de Curitiba reconheceu a veracidade dos documentos e o pirata entrou para a história oficial da cidade.
O tesouro do pirata.
Ainda de acordo com a pesquisa de Marcos, Zulmiro contou que ele e mais dois piratas, Zarolho e José Sancho, fizeram um pacto sobre o tesouro. “Os três escolheram uma ilha deserta no meio do oceano, a Ilha de Trindade, para ser o depósito dos roubos que eles realizavam: uma espécie de banco pirata. Na Ilha existiam dois locais secretos, sendo um conhecido somente pelos piratas. Esse depósito ficava no interior da ilha e era chamado de “A Burra”.
De acordo com o próprio pirata, o local era o mais rico daquele território, já que contava com barris repletos de moedas e barras de ouro, pedras preciosas e ouro em pó. Também havia outro depósito na praia da baía, no qual continham muitas barras de prata e trabalhos artísticos em ouro puro.
“Segundo Zarolho, que morreu na Índia em 1850 (mas, antes, entregou o mapa do tesouro escondido nesse depósito para um capitão chamado Polly, de Newcastle), as peças de arte de ouro maciço eram da Catedral de Lima e foram transportadas em um navio capturado por ele em 1821. No local, ocorreu um grande deslizamento de terra que o deixou encoberto com centenas de toneladas de entulhos”, acrescentou o pesquisador.
As expedições brasileiras.
Segundo Ofenbock, quatro expedições foram realizadas entre 1910 e 1911. “O roteiro foi descoberto pelo sobrinho de Edward Young”. Mesmo sem sucesso, devido à natureza vulcânica da ilha, as expedições foram muito noticiadas na época.
Além disso, o local sempre apresentou diversos desmoronamentos. “Todos os marcos do roteiro foram apagados. Uma curiosidade é que o roteiro do tesouro escrito pelo pirata Zulmiro foi publicado na íntegra em pleno início da Segunda Guerra Mundial, no jornal A Noite, do Rio de Janeiro”, afirmou o escritor.
Dos túneis jesuítas a descoberta do enigma.
A pesquisa, que durou 15 anos, teve início quando Marcos descobriu diversos túneis secretos no centro histórico de Curitiba. Em seus primeiros passos, ele notou que havia outros locais secretos mais afastados do centro da cidade.
Não obstante, ele já era familiarizado com a lenda que dizia que o pirata Zulmiro havia escondido um tesouro nesses túneis. “No início, eu também acreditava que essa história de pirata era puramente lenda urbana, mas, no fim, com persistência e dedicação, consegui desvendar todo o enigma”.
Mais tarde, Marcos decidu publicar um livro para contar sobre a sua descoberta. No dia 17 de julho de 2019, o escritor lançou sua obra intitulada A Verdadeira Ilha do Tesouro, as Crônicas do Pirata Zulmiro.
“A pesquisa é importante pelo valor historio, pois a literatura sobre a pirataria diz que o último capitão pirata do mundo foi enforcado nos EUA. Mas, na verdade, o último mesmo é um ativo cultural para o Brasil”, concluiu.
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