sábado, 16 de maio de 1992

Chica da Silva, de escrava a Rainha.

 

CHICA DA SILVA – DE ESCRAVA A RAINHA

 

"AINDA QUE SEJA PASSAGEIRO COMO UM COMETA, FALANDO COM OS ASTROS, RASGANDO O CÉU, ILUMINANDO A NOITE, ROMPENDO OS LIMITES DO ESPAÇO, DESAFIANDO O TEMPO. A NOITE SEMPRE SERÁ UMA FONTE DE INSPIRAÇÃO INESGOTÁVEL".  (Vanessa Candia)

 

SUMÁRIO

 

INTRODUÇÃO  ...........................................................................................................................

 

O ANTIGO TIJUCO QUE HOJE É DIAMANTINA  .........................................................

 

BREVE CRONOLOGIA ...............................................................................................................

 

CHICA DA SILVA  .....................................................................................................................

 

MOEDAS DO BRASIL COLÔNIA  ........................................................................................

 

XICA DA SILVA, O FILME  .................... ............................................................................................

 

CENAS DO FILME XICA DA SILVA  ...................................................................................

 

FICHA TÉCNICA DO FILME XICA DA SILVA  ................................................................

 

CONCLUSÃO  .............................................................................................................................

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................... .....................................................................................

 

 

INTRODUÇÃO

 

Este trabalho propõe um estudo sobre a história da vida de Francisca da Silva, mais conhecida como Chica da Silva, e as riquezas de Minas Gerais no século XVIII. Dando enfoque em algumas características deste período colonial. Através das informações obtidas em fontes literárias e cinematográficas, buscando esclarecimentos para compreensão maior e entendimento sobre o assunto.

 

O presente estudo foi pesquisado através da separação de fontes literárias como clássicos antiguissímos e livros mais atualizados assim como enciclopédias e um filme para análise. Estes primeiros passos começaram com a coleta de livros e a separação do material para o tema escolhido. O surgimento do tema fluiu através de uma curiosidade e uma grande admiração pelo tema.

 

 

Consultamos diversas áreas, como a Biblioteca Pública, a Biblioteca da Universidade Católica do Rio Grande do Sul, a Biblioteca da UFRGS, e outras fontes retiramos de nossas casas e as de amigos. A leitura facilitou nosso compreendimento para a pesquisa, pois deu um enfoque acentuado e proporcionou-nos conhecimento sobre a época colonial do nosso país.

 

 

O ANTIGO TIJUCO QUE HOJE É DIAMANTINA.

 

Um dos momentos econômicos que o Brasil viveu no período colonial foi o ciclo da mineração. Os anos de ouro começam com a descoberta das jazidas de ouro e de pedras preciosas no fim do século XVII. A partir de 1723, nas lavras de cascalho aurífero do Tijuco, paragem que dependia da guarda - moria da vila do príncipe começaram a ser notadas, de permeio com o ouro, certas pedrinhas reluzentes e duríssimas. Até então, os mineradores, que não lhes conheciam outra utilidades, guardavam-nas como curiosidades ou as empregava como tentos nos jogos de gamão. Eram diamantes, aqueles pequenos seixos desconhecidos, exatamente por que só se cuidava então da extração do ouro e não era ainda conhecido o diamante, não se pode precisar onde teria sido ele descoberto, ou achado pela primeira vez. O fato é que, já em 1729 os diamantes do Tijuco estão descobertos e explorados. O governador, Dom Lourenço de Almeida, anula as cartas de datas em terrenos diamantinos e toma uma série de medidas em favor dos direitos da Coroa, entre os quais a captação de 5$000 por escravo empregado na mineração.

 

Porém, logo em 1731 o rei suspende o regime de captação e estabelece o arrendamento das lavras a prazo determinado, proibindo sob pena de degredo para a Angola e confiscação de todos os bens, o trabalho nessas lavras aos que não oferecessem lanços. Como se pode avaliar o sistema, não haveria de resultar eficaz, por que recrudesceram as colheitas ilegais e o contrabando das pedras. Novas medidas drásticas são tomadas pela Administração colonial, havendo uma série de despejos e confiscos nos terrenos diamantinos. Com as costumeiras ameaças de degredo para Angola, e se botando fora aos que se acusa especialmente de serem os instrumentos mais eficazes dos descaminhos dos diamantes, e contra os quais se tomam medidas descriminativas de porte de armas. A coroa estrutura toda uma administração burocrática para o controle do negócio dos diamantes. Cria, 1734, a intendência dos diamantes, no arraial do Tijuco, que tem a seu cargo a gerência das lavras diamantíferas, com alçada no cível e no crime.

 

Página com fotos da mineração.

Depois do ouro veio o diamante. Os rios que cruzam Minas, continuam sendo explorados.

 

Como os limites das lavras não estão devidamente configurados, "para obviar a incerteza e a confusão dos direitos dos concessionários de lavras auríferas e determinar a jurisdição das autoridades que se criavam e executar-se o novo regimento", chega o especialista Martinho de Mendonça de Pina e Proença, para em nome do rei, proceder a demarcação das terras diamantinas: colocam-se padrões nas raias delimitadas e eis o distrito Diamantina, verdadeira extravagância jurídica e administrativa: única na história, assim comentará a estranha instituição o viajante Volmartius, é essa idéia de isolar uma comarca, na qual todas as condições civis estavam sujeitas a exploração de um bem da coroa. Já então governava as Minas Gerais, o conde das galveias (Dom André de Melo e Castro). No seu consulado ainda não se adota definitivamente o regime de captação e se passa ao do arrendamento por braças. Mas a solução que a corte de Lisboa acaba por adotar é a da arrematação dos contratos de contratação que vai vigorar de 1736 a 1771, a famosa era dos contratadores, os Fernandes de Oliveira e os Caldeiras Brantes, que somente findará com a administração direta REAL EXTRAÇÃO, a implacável descrição do livro de capa verde.

 

De qualquer forma, constrangidos entre os arrochos fiscais do ouro e dos diamantes, os mineradores, que, até 1730, procuraram somente o fulvo metal, voltam-se em grande parte, para a atividade mais nova e mais rendosa dos diamantes. "Grande n°. de habitantes da vila do príncipe e povoações circum vizinhas conta Joaquim Felício dos Santos atraídos pela nova mineração, vieram estabelecer no Tijuco, com suas famílias, e o arraial começou a estender­se subindo pela vertente em que e.stava situado até a raiz das Gupiaras: assim se chama a parte mais elevada do flanco oriental do Morro de Santo Antônio". O arraial do Santo Antônio do Tijuco começa a viver o seu grande destino, logo deslocando CERRO DO FRIO," o centro demográfico, político e econômico da comarca, principalmente depois que se vai acrescentam da chegada de forasteiros de toda parte, como portugueses, ávidos das riquezas fantásticas que a fama exagerada das gemas tijuquenses lhes soprara aos ouvidos, a lei mar. Na verdade, por que as terras ainda estavam virgens dos trabalhos da extração, as primeiras safras resultaram auspiciosamente fecundas e as frotas levaram rapidamente para Lisboa, partidos de pedras do mais alto kilate.

 

E foi assim, que, em pouco mais de trinta anos a corte portuguesa foi abalada duas vezes por essas notícias prodigiosas, verdadeiras manchetes da fortuna que foram os ouros e diamantes. Manifestados nas Minas Gerais. Eram dois pactos formidáveis, que teriam, com certeza, o condão de abalar os grilhões com que acorrentara o reino, o tratado de Methuem: talvez as novas riquezas descobertas poderiam minorar a triste situação econômica a que fora reduzido. O governo de D. João V, volta, então, suas atenções para a colônia esquecida, mas numa intervenção míope, inábel e imediatista: "então, e só então - completa o senhor Sérgio Buarque de Olanda, estudando a política colonialista portuguesa do tempo. É que Portugal delibera intervir mais energicamente nos negócios de sua possessão ultramarina, mas para usar de uma energia puramente repressiva, policial e menos dirigida a edificar alguma coisa de permanente do que a absorver tudo quanto lhe fosse de imediato proveito". As Minas Gerais torcem o verdadeiro "ELDORADO" da coroa portuguesa. Por sua vez, as vilas tem os seus intendentes que são os mesmos ouvi dores quando dispõem de casas de fundição, cujos servidores são de provimento do governador da capitania: ficais, tesoureiros, escrivães da receita e despesa, da intendência e conferência, da entrada do ouro nas forjas, ensaiadores e seus ajudantes abridores nos centros de mineração. O pessoal de obras destas casas de fundição é sempre um punhado de negros, as voltas com seus cadinhos, seus fólis com lenha e carvão, com porções de solimão e água forte, para os ensaios do ouro, a base da prata dos pesos duros.

 

Portanto reside na ação mais decidida dos governadores e em sua manópla militar correspondente o melhor rendimento da ordem pública, e, pois, da coleta dos "direitos do rei". Principalmente destes, que são as contribuições de quintagem ou de captação, e mais, aqui é que acresce o ônus fiscal sobre as populações os dízimos, os direitos de entrada, os de passagem dos rios, os donativos e direitos de ofícios, o subsídios voluntários, os subsídios literários, os da extração diamantina, para não referir os impostos indiretos cobrados nos. "registros" aduaneiros. Diante deste quadro impressionante de rendas para a Coroa, a corte de Lisboa em geral, e o rei D João V em particular, tomam-se de crescente exaltação ufanística, que acaba por traduzir-se na mais desfigurada versão das possibilidades econômicas da capitania dourada, ainda ontem o desprezado sertão do Cataguá.

 


 

É verdade que tem havido muito exagero no cômputo em bruto da produção aurífera e diamantina. Infelizmente os números alusivos aos nossos rendimentos coloniais não estão facilmente a mão. As contas do tesouro do reino transitavam então debaixo do mais rigoroso sigilo era vedado dá-las a público, delas fazer comentários ou tirar interpretações, a não ser genericamente. Só nos livros e correspondências oficiais é que podemos achá-las. As instruções e memórias escritas sobre o assunto, no tempo, são muito raras. Como, por exemplo, a instrução para o governo da capitania de Minas Gerais, escrita em 1780, pelo desembargador José João Teixeira Coelho, onde tem sua base" as cifras mais geralmente mais utilizadas pelos historiadores". De uma forma ou de outra, o que vale prevalecer é o juízo de que os lucros " fabulosos do ciclo do ouro e dos diamantes, serviram muito mais a economia particular do que as financias régias. A produção aurífera foi, efetivamente, brutal. Calógeras avalia a, num século e pouco de extração mineradora, em 51.500 arrobas ou 772.500 kilos, até 1820, assim distribuída, segundo os sistemas de arrecadação que vigoraram. Por sua vez, Roberto Simonsen a base de dados colhidos por João Lúcio Azevedo, calcula em perto de 10.000.000 a produção bruta de diamantes, em toda a era colonial.

 

A produção do ouro e das gemas preciosas fomenta o escambo comercial entre as localidades sertanejas, fazendo surgir os transportes regulares das tropas. O fastígio desta vida requintada principia nos tempos dos contratadores, dentre os quais se destaca o famoso paracatuano Filisberto Caldeira Brante, ele próprio um dos corifeus dessa mentalidade casquilha e extravagante. Assumindo o contrato dos diamantes nos anos de 1749 e 1753, ele vive como um nabado oriental: sua baixela era de ouro e de prata e seus bens mesmo avaliados a um preço mínimo (pois a casa do contrato, sua residência foi estimada em apenas 700$000) montavam a dois mil cruzados da época. Importância que para aquele tempo, em pleno sertão brasileiro era verdadeiramente extraordinária. Após sua destituição acharam-se nos cofres da intendências 33.777 kilates de diamantes.

 

Outro creso mineiro é o contratador Fernandes de Oliveira Filho, o qual, mais que pela fabulosa riqueza passa a história como o amante complacente da mulata tijuquense Francisca da Silva de Oliveira, a notória Chica da Silva, a cujos caprichos satisfazia imperturbavelmente, por mais absurdos que fossem, inclusive o do seu teatro particular, dotado de toda a maquinaria necessária para a representação das peças do tempo, tais como "Os Encantos de Medéia", "O Anfitrião", "Porfiar Amando", "Chiquinha, por amor de Deus" e outras. Aliás, não é somente na corte do Tijuco que se levam as cenas peças de teatro.

 

                           Para suprir o mercado das minas, novas atividades iriam se desenvolvendo. Com a mineração surge um mercado interno para o consumo de gêneros alimentícios e artigos manufaturados, chegavam as minas através de tropeiros, responsáveis pela fundação de importantes povoados como Sorocaba em São Paulo. O chamado ciclo da mineração impulsionaria a urbanização na região das minas, ampliando as camadas sociais intermediárias: advogados, médicos, professores, comerciantes e etc. A essa diversidade de ocupações e ofícios somava-se o caráter novo de sua composição social As características específicas da. atividade mineradora favoreceram inicialmente o enriquecimento e a ascensão de indivíduos de todas as categorias e procedências. Logo, pequenos comerciantes ou simples artesãos assumiam postos oficiais de prestígio; mineradores humildes, que nem sequer possuíam escravos, eram favorecidos pela sorte. Nos primeiros tempos da mineração, qualquer um podia descobrir uma jazida: os instrumentos de trabalho eram rudimentares e a distribuição das datas(lotes para mineração) era feita por sorteio. A mineração clandestina era até maior do que a legal e o contrabando constituía a atividade preferencial de muitos. Com a corrida do ouro surgiram dezenas de novas cidades, especialmente no centro - sul.

 

O aparato administrativo foi ampliado, mas sua autonomia era bastante limitada pela ação direta da Coroa e pela subordinação aos órgãos sediados em Portugal, com isso as elites ficavam mais insatisfeitas. Depois da descoberta do ouro a fiscalização das atividades era mais puxada e severa. A atividade dos proprietários de lavras era limitada por uma grande quantidade de regulamentos e leis pela ação direta das Intendêcias das Minas. ¹

 

Precisavam de organização administrativa e comunitária justamente em nome do Estado, pois eram muitos os povoados próximos. A extração de minério chamou tanto a atenção que começaram a aparecer povoados com muita rapidez. O contrabando e a sonegação de impostos foi possibilitada enquanto a Coroa assegurava seus privilégios no Brasil através de uma complexa rede de restrições. "Muitos acabaram beneficiando-se, mas conflitos e revoltas destacavam-se também. A partir da segunda metade do século XVIII o rendimento das minas começou a cair e com isso a arrecadação do quinto também caiu. O quinto era o imposto instituído pela metrópole portuguesa, correspondente a quinta parte de todo o ouro, prata e perdas preciosas que fossem extraídas do solo brasileiro no período colonial. A fiscalização tomou-se, mais severa e começou a adotar outras medidas como a proibição das manufaturas em toda a          colônia, tudo isso para compensar as perdas com o ouro.

 

A crise do antigo sistema começa em fins do século XVIII, este problema afetou todas as áreas tanto social, como política, econômica, das idéias e etc. Portugal afetou-se economicamente com a queda no ouro e o declínio do açúcar e os laços se apertaram ainda mais. A metrópole, conhecia a potencialidade da área aurífera e tratou de impor seu domínio sobre a atividade mineira. Imediatamente procurou exercer restrições ao fluxo populacional as minas.

 

A imigração descontrolada e o envio maciço de escravos às Gerais, além do eventual enfraquecimento econômico e militar de outras regiões, poderia constituir sério obstáculo ao controle régio sobre a riqueza que se materializava após séculos de espera empunha­sse amortecer a corrida as minas, enquanto se estabelecia uma nova estrutura administrativa na colônia, mais em positiva e capaz de executar com eficácia seu principal papel, ou seja, arrecadar os tributos devidos a coroa, em particular os famigerados quintos sobre o ouro, "a sua sagrada dos metais". A estrutura de dominação colonial vigente nos dois primeiros séculos de colonização dava lugar a outra, nos quadros da qual a centralização do poder do Estado e os vínculos coloniais ampliavam-se.

 

Sobre a colônia descem as sufocadoras garras da administração colonial, cortadas nos conselhos do reino, sem respeito pelas peculiaridades do trópico. O Estado sobre põe-se, estranho, alheio, distante da sociedade, amputando todos os membros que resistissem ao seu domínio. Nenhum contato nenhuma onda vitalizadora flui entre governador e as populações: a ordem se traduz na obediência passiva ou no silêncio. Após os primeiros anos da lide extrativa e as apontadas crises de fome, o abastecimento de gêneros gradativamente normatizou-se, com mercadorias provenientes das mais variadas partes da colônia e de Portugal. Segundo Antonil:

 

"tanto que se viu a abundância do ouro que se tirava e a largueza com que se pagava o que de lá ia, logo se fizeram estalagens e logo começaram as mercadorias a mandar às minas o melhor que chegava nos navios do reino e de outras partes, assim de mantimentos como de regalo e de pomposo para se vestirem, além de mil bugiarias da França, que lá também foram dar". ²

 

No século XVIII,  Minas representou o centro catalisador da colônia; ali consolidara-se uma sociedade com elevado poder de compra, tanto peja densidade populacional como pela relativa pulverização da riqueza geral. Daí, diz que Minas dá a primeira nota de integração nacional.

 

BREVE CRONOLOGIA

 

1720 - É criada a capitania das Minas Gerais, separada de São Paulo. Portugal eleva a tributação do ouro para um quinto (20%) do metal extraído e cria as chamadas Casas de Fundição, proibindo a circulação do ouro em pó ou em pepitas. Explode a Rebelião de Vila Rica. Felipe dos Santos domina Vila Rica por cerca de 20, vinte dias. É enforcado e esquartejado.

 

1750 - A Coroa institui como tributo uma cota fixa anual de 100 arrobas de ouro.

 

1762 - É decretada a primeira derrama, pagamento forçado dos impostos atrasados.

 

1763 - A capital da colônia é transferida para o Rio de Janeiro. ³

 

 

CHICA DA SILVA

 

A história de Chica da Silva se passa no século XVIII, quando, exauridas as possibilidades econômicas dos ciclos do pau-brasil e da cana-de-açúcar, iniciava-se para a colônia a sua época mais próspera, mais rica e mais sangrenta: o ciclo da mineração. Até então, foi no Nordeste, especialmente em Pernambuco e na Bahia, que se haviam concentrado os investimentos e esforços da Coroa portuguesa. Em decorrência de seus compromissos de potência colonial e marítima e das circunstâncias da política européia, a metrópole precisou de maiores recursos e, assim, voltou seu interesse para a região das minas. Nesse momento, havia apenas relatos lendários de uma espécie de Eldorado, já conhecido pelos índios da região: um grande e contínuo veio de ouro e riquezas, que se prolongavam subterraneamente, cortando a região de Minas Gerais de ponta a ponta, e prolongando-se além dela. O sistemático trabalho escravo revelou a presença do ouro. Mas isso foi apenas a primeira: fase do brilhante ciclo econômico" porque logo depois descobriu-se também a existência de diamantes justamente na região de Diamantina. A descoberta do ouro e a revelação dos diamantes trouxeram mais trabalho, mais escravidão e profuso sangue à população, e à metrópole uma riqueza que logo lhe escapou das mãos e, através de complicadas manobras políticas, beneficiou a Inglaterra.

 

Chica da Silva surgiu no período mais turbulento do ciclo da mineração, no momento em que a Coroa cobrava impostos e taxas cada vez maiores da colônia. Era uma escrava que viveu no Arraial do Tijuco (hoje Diamantina), interior de Minas Gerais, na segunda metade do século XVIII, e mobilizou a cidade de 1750 a 1770. Nessa mesma época, a Coroa portuguesa instituiu para o distrito diamantino um sistema de contratos que garantiram o monopólio da extração de pedras preciosas a um capitalista português escolhido pelo rei.

 

Enviado por Dom João V, de Portugal, João Fernandes de Oliveira, o contratador de diamantes, veio, então, para o Brasil, como dono do quinto contrato de mineração outorgado pela Coroa, que lhe valia o monopólio da extração de pedras preciosas, com participação do governo. Cabia a ele também a fiscalização rigorosa, administração e policiamento das áreas de extração mineira. Na época, era o cargo mais importante na colônia.

 

João Fernandes implantou sistemas modernos e eficazes e acabou descobrindo lavras riquíssimas nos rios e nas montanhas. Ele fez uma fortuna talvez maior do que a da Coroa, tomando-se incômodo para Lisboa. O contratador apaixonou-se por uma negra escrava, mucama das donas e brinquedo sexual dos senhores, tomando-se, ele próprio, o escravo dessa paixão. Nunca se soube que sedução irreprimível foi aquela que prendeu, por quase toda a vida, o desembargador João Fernandes de Oliveira aos braços grosseiros de Chica da Silva. Estupendamente rico, o mais rico de todos os nababos que Minas teve naqueles últimos decênios, mais rico talvez, que o rei de Portugal com as Índias, Guiné e tudo, o sexto contratador de diamantes teria tido a mais bela e mais fulgurante das mulheres do Tijuco. Entre 1761 e 1795, o Tijuco estava no mais estonteante florescimento. A superstição popular de que o terremoto de Lisboa se repetiria, fez com que muita gente fidalga de Portugal se derramasse em procura de Minas. A zona opulenta era a mais fascinadora e, das zonas dos diamantes, era o Tijuco a culminância da opulência. O suntuoso arraial tinha uma vida febril e resplandescente. Havia dinheiro que 'hão se contava, havia luxo de espantar. A vida dos salões tinha tido o toque do bom gosto de Felisberto Caldeira e era igual à de qualquer dos fmos salões de Lisboa, e muitas saias, que fulguravam na corte portuguesa, ondulavam pelos assoalhos lustrosos das salas do arraial mineiro.

 

O desembargador teria, se quisesse, a mão da mais alta fidalga de Portugal. A sorte, porém, o amarrou cegamente, incrivelmente, irremediavelmente, às saias desgraciosas daquela escrava inculta. Chica da Silva, ao que contam os cronistas, nada tinha na vida, no corpo e no espírito que pudesse prender um homem.

 

Era uma mulata escura, beiços grossos, nariz chato, enorme de carnes de feições ásperas. Não trazia nenhuma das graças femininas, que são, às vezes, mais embriagadoras que a beleza. Nem ao menos um desses lampejos de coração e de bondade, que são sempre os nós indesatáveis que seguram os homens às mulheres feias. Tudo nela era grosseiro e chato como o nariz. O opulento contratador conheceu-a alí mesmo no Tijuco, no "eito", descalça, a pingar suor, de tanga e cabeção de zuarte. Acredita-se que partiu daí a sua paixão. Chica era escrava do padre José da Silva e Oliveira Rohm, que figurou depois no número dos inconfidentes mineiros. Foi a pedido do desembargador, ou pelo seu dinheiro, que o padre a vendeu. Ninguém pode compreender a pertinácia e a solidez daquela paixão de nababo pela humildade de uma cativa. Nem mesmo a sedução da virgindade ele encontrou na mulata. Quando a conheceu, já era mãe de dois filhos. Começou daí o domínio absoluto de Chica sobre o coração do desembargador e a sua estupenda importância no Tijuco.

 

João Fernandes de Oliveira fora o mais feliz dos contratadores de diamantes da quadra pombalina. Nunca se extraíram tantas gemas como no tempo de seu contrato- Parecia que a dextra de uma fada oculta o guiava em todas as explorações. Até mesmo nos lugares por outros abandonados como imprestáveis para a mineração, ele ia encontrar a fortuna. O prestígio do dinheiro dava-lhe um poder de soberano. Ao seus pés curvava-se tudo. Nem mesmo o intendente, o tolerante e comodíssimo Francisco José Pinto de Mendonça, lhe opunha barreira ao domínio. Só diante de uma criatura o seu orgulho braqueava, a mulata que conhecera suarenta, no "eito", de tanga e cabeção. Chica da Silva fora a mulher mais extravagantemente bizarra que houve no Brasil pela época de Pombal. Senhora absoluta do coração do contratador, dominou o Tijuco com magnificência de uma rainha. A seus pés viveu o Tijuco inteiro, como um escravo obedecendo ao senhor. Quem queria um favor de João Femandes tinha que pedir primeiramente a Chica, o contratador nunca a contrariou num só capricho. Foi a mulher que, no Brasil, mais ouro teve, naquele tempo, para gastar. E, nadando em dinheiro, coberta de adulações e diamantes, ninguém mais do que ela, alardeou tanta riqueza, nem teve. caprichos mais alucinados.

 

O seu guarda roupas, sem gosto, como é de prever, foi o mais numeroso, o mais caro que se conheceu. As jóias que lhe ornavam os braços e o pescoço fariam inveja a qualquer rainha. Tudo que havia de melhor no Tijuco era para ela. O preconceito da cor, naquela época, devia ser profundo e terrível. Conseguiu calcar o preconceito, aos pés. Nas igrejas (e havia, naquele tempo, igrejas onde só gente branca podia entrar) o lugar de honra era seu. A missa, a que a amante contratador assistia, era sempre um acontecimento. A mulata dava, com a sua presença, os tons de uma grandeza real. Só entrava nos templos nas altas solenidades, rutilantemente vestida, coberta da cabeça aos pés das jóias mais fulgurantes, à guisa de aias, trajadas de seda, apanhavam-lhe a imensa cauda do vestido espalhafatoso.

 

Os seus salões foram os mais afamados do Tijuco. Ainda lá estão, no velho arraial, os escombros da célebre chácara da Chica da Silva. Mandou-a erguer o desembargador. Gastou-se uma fortuna ali dentro. Era um palácio colossal, pretensioso, com aspecto de castelo, amuradas, torres, capela rica, vasto parque com cascatas e lagos para passeios e pesca, floresta para a caça, pomar e jardim de plantas exóticas. Havia até uma sala rigorosamente construída para o teatro. Nesta que Chica dava as suas festas esplendentes, toda a nobreza do Tijuco comparecia. Havia banquetes faustosos, quê custavam rios de dinheiro, bailes a rigor, cabeleiras empoadas, saias balão e decotes à moda da corte lisboeta. Ao cair da noite iluminavam-se as cascatas e os lagos artificiais. Ela tinha o prazer especial de obumbar toda aquela gente com a sua opulência. Apareciam nos lagos barcos dourados, imitando as gôndolas de Veneza que ela trazia os convivas para a beira das águas, iluminadas, e todo aquele rancho de fidalguinhas pretensiosas e de fidalguetes pedantes, dava gritinhos de alegria ao vogar nas gôndolas, à superficie dos lagos faiscantes. Garantiu a alforria de Chica, dando-lhe direitos e poderes que nem as damas mais importantes da colônia desfrutavam, e tratava-a como uma rainha, para escândalo da burguesia colonial insultada na sua dignidade. Ele satisfez todos os caprichos exóticos da ex-escrava e Chica transformou-se na rainha negra dos diamantes, impondo suas extravagâncias, sua imaginação extraordinária e sua maravilhosa doidice. Ela chegou a dominar a política, a moda e a economia da região.

 

FOTO DA IGREJA

 

Igreja do Carmo, em Mariana, onde Chica da Silva assistia às missas. O pelourinho, símbolo do poder nos arraiais, ficava diante da igreja. 4

 

No seu teatro mais tarde, vinham de longe comediantes, principescamente pagos, representar as peças mais afamadas do tempo: o Anfitrião, os Encantos de Medéia, Xiquinha por amor de Deus, Porfiar amando. etc. A vaidade da ex-escrava do padre Rolim foi crescendo à proporção que o Tijuco se ofuscava com o seu luxo. No arraial, a nobreza feminina usava cabeleira anelada, caindo em cachos, pelos ombros. O cabelo de Chica da Silva era duro e imprestável para o penteado da moda. Mandou raspar a cabeça e ostentou audaciosamente uma cabeleira postiça, ondulada, de fios sedosos, como os dos cabelos das brancas. Tendo de baixo dos pés a riqueza do maior nababo que se conhecia, começou a ter caprichos desvairados. Certa vez, Chica, senhora de uma corte particular de mucamas, músicos e lacaios diversos, não contente com seus vestidos vindos de Paris, com as jóias que quisesse e com tudo o mais que o dinheiro e o poder de João Fernandes pudessem comprar, quis conhecer o mar, navegar, sentir a sensação de estar num navio. Ela, porém, por um desses dengues de mulher, não queria afastar os pés da terra que a vira escrava antigamente e dominadora agora. Queria um navio, mas ali, no Tijuco. Isso era impossível no interior de Minas, sem porto de mar. Mas o Diabo de mulher queria! Como Diamantina ficava muito longe do mar, e para alcançá-lo seria necessário uma viagem perigosa e longa demais, o contratador resolveu o problema: mandou rasgar um grande lago na imensa chácara, e, sobre o lago, uma deslumbrante galera, equipada com todo o luxo e esplendor. Nessa galera, com tripulação de oito pessoas e animada por artistas, pelas mucamas e lacaios, Chica da Silva realizava o seu sonho de viajar. E no Tijuco, ela andou num navio, como se estivesse no mar! No fundo, tinha incontido desprezo aos portugueses, e um rancor constante contra brancos. Certamente lhe chegavam aos ouvidos as zombarias que, à surdina, a sociedade tijuquence, na maioria portuguesa, fazia do seu luxo, da sua cor, da sua origem e das suas gafes. Aquela anedota que o Dr. J. Felício dos Santos conta nas Memórias do Distrito Diamantino, é característica. Um dia, chegaram ao Tijuco vários rapazes, gente da melhor sociedade de Portugal. Traziam para Chica, recomendações das figuras mais evidentes da corte. Ela os recebia benevolamente. Eles explicavam o que queriam. Queriam ganhar dinheiro, queriam enriquecer na terra em que a riqueza era tão fácil. Chica ouve-os sorrindo.

 

 

FOTO DA CASA DA CHI CA DA SILVA

 

" A casa de Chica da Silva era a maior construção da zona diamantífera.” 5

 

 

Nesse momento vai passando um escravo. Chama-o e, num gesto senhoril, ordena, indicando os portugueses. Cabeça, era o nome do escravo, mandou ele cuidar dos marotinhos. Retira-se do salão, como se nada tivesse dito, e arrastar a cauda do seu longo vestido de seda. Depois, como uma grande honra, como um favor especialíssimo, em consideração as cartas que eles tinham trazido, manda-os trabalhar com os negros, nos serviços da mineração. O fato de ser sempre obedecida pelo amante fê-la não admitir a desobediência de quem quer que fosse. Aquele que a contrariasse teria as iras do seu coração vingativo. Ainda se conta, em Minas, uma das suas vinganças mais extravagantes. Um negro, de que a história não conservou o nome organizou uma "marujada" no Tijuco. Chica da Silva mandou-lhe dizer que viesse com a "marujada" à sua chácara. Mas o negro estava já comprometido com um dos grandes do arraial. Estaria pronto a cantar na chácara depois de cantar onde estava prometido. Ah ! Não! Chica não podia admitir semelhante diminuição a sua importância. Primeiro ela ! E, no dia seguinte, mandou comprar o negro. Pô-lo no seu jardim noite e dia a cantar, a tocar o pandeiro da "marujada". Foram, dias a fio, aquele bater sinistro do pandeiro. O escravo era uma envergadura de aço e resistiu. Ela cansou-se, deu-lhe a liberdade.

 

Nunca se soube que diabo de atração o contratador encontrou na figura da cabrocha. Nem graça de mulher, nem sutilezas de espírito, nem doçuras do coração, mas filhos isso ela lhos deu muitos. Uma récua, nada menos de treze: João, Antônio, José, Joaquim, Francisca, Rita, Ana, Helena, Luiza, Maria, Quitéria, Mariana e Antônia. Além dos dois que trouxe quando iniciou a mancebia, e que eram filhos do Dr. Manuel Pires Sardinha. Um deles é o célebre Dr. Simão Pires Sardinha, com o qual o desembargador gastou fortunas colossais para educá-lo, fazendo-o correr a Europa com ampla autorização de gastar. Chica da Silva foi a mulher mais opulenta e mais feliz do seu tempo.

 

A posição de João Fernandes obrigava a sociedade local a receber a senhora Francisca da Silva com reverências devidas a excelências. E a exibição de deboche da ex-escrava foi gradativamente acirrando contra o contratador os ânimos invejosos dos funcionários e fidalgos da terra, e os ecos dessas vozes indignadas acabaram por levantar contra ele a suspeita e o rancor da Coroa.

 

Quando o desembargador, em 1775, instituiu o morgado de Grijó, o primeiro nome que apareceu na ordem das sucessões foi o de seu filho João, o seu primogênito com Chica. Depois de 12 anos vivendo juntos, o contratador terminou em desgraça, despojado de seus bens e preso. Chica, voltando às origens, muda de cidade, morreu afogada em ouro, dando fidalgos a Portugal, mas permaneceu para a eternidade na memória do povo. Mas, já na primeira metade do século XIX, a história não dá mais notícias da vasta descendência da amante de João Femandes. A decadência arrasou tudo. Só há notícia, um tanto recente, de Maria Vicência, neta da dominadora do Tíjuco. Maria Vivência, essa acabou esmolando, de alpercatas e bordão, pelos caminhos de Macaúbas. O marido esbanjou tudo que ela possuía e arirou-a depois à miséria no mundo.

 

 

HISTÓRIA DAS MOEDAS DO BRASIL.

 

BRASIL COLÔNIA.

 

A história monetária do Brasil se inicia logo após o descobrimento, com as primeiras manifestações comerciais realizadas entre europeus e nativos. Tais atividades constituíam-se na troca de produtos naturais - pau-brasil, principalmente por miçangas, anzóis, facas e outros objetos. A colonização da terra alterou este quadro: gradativamente, foi-se estabelecendo o numerário português corrente na Metrópole. O domínio espanhol sobre Portugal entre 1580 e 1640, bem como a proximidade de suas colônias na América, incentivou a introdução das moedas de prata hispano-americanas no Brasil A partir de 1642, tanto as moedas espanholas quanto as portuguesas receberiam o carimbo denominado "coroado", que tinha por finalidade aumentar seus valores e limitar sua circulação à nossa terra.

 

O início da escravidão trouxe um novo elemento para o meio circulante: o cauri, pequeno molusco que corria na África como moeda, foi utilizado na compra de escravos no continente africano e entre os negros estabelecidos na Bahia. Encontramos ainda como meio de aquisição o açúcar, o sal, o fumo e outros produtos da terra. Durante a ocupação holandesa no Recife, os invasores cunharam moedas de emergência para pagamento das tropas. Foram as primeiras a apresentar o nome BRASIL na legenda: florins de ouro, em 1645 e 1646, e soldos de prata em 1654.

 

 

FOTO DAS MOEDAS

 

Dinheiro no Brasil - Museu do Banco do Brasil

 

Fato da maior importância ocorreu em 1694, no reinado de D. Pedro II de Portugal. Naquele ano, foi criada em Salvador a primeira Casa da Moeda do Brasil. Ela seria transferida mais tarde para o Rio de Janeiro e, posteriormente, para Pernambuco. Ali funcionaria até 1702, retornando então, definitivamente, para o Rio de Janeiro. Devido à constante falta de troco, o governo determinou que circulassem, também aqui, as moedas de cobre lavradas na Casa da Moeda do Porto e destinadas a Angola. A aclamação de D. João V, em 1706, coincidiu com o apogeu do Ciclo do ouro. É dessa época a criação da Casa da Moeda de Vila Rica, na Capitania das Minas Gerais, que funcionou simultaneamente com as do Rio de Janeiro e da Bahia. Delas saíram algumas das mais. belas peças de ouro, como as séries de "escudos" e os célebres "dobrões" de. Minas Gerais. Embora destinadas à metrópole, circularam também entre nós.

 

 

A criação do sistema monetário provincial para o Brasil, em 1695, não repercutiu no Estado do Maranhão. Ali, o meio circulante era constituído pelo- algodão em fio e tecido. (Dinheiro do Brasil - Museu do Banco do Brasil).

 

FOTO DAS MOEDAS DE OURO

 

Finalmente, em 1748, atendendo aos reclamos da falta de numerário, foi decretado que se cunhassem, em Lisboa, moedas de ouro, prata e cobre para aquela região. A fim de atender à população das Minas Gerais, que se mostrava insatisfeita com a absorção de todo o seu ouro pela Metrópole, foram batidas em Lisboa, para que corressem naquela Capitania, moedas de cobre de XL e XX réis com a legenda AES USIBUS ­APTIUS AURO ( "O cobre para os usos é mais conveniente que o ouro" ). Proibido o emprego do ouro em pó ou em pepitas corno moeda, foram criadas, no século XVIII, as Casas de Fundição de Vila Rica, Sabará, Serro Frio, Rio das Mortes, São Paulo e Cuiabá. Nesses estabelecimentos, deduzido o quinto. imposto de 20% cobrado pela Coroa - o metal era fundido em barras. Estas, acompanhadas de guias comprovadoras da legítima posse, eram posteriormente restituídas ao seu portador.

 

Durante o reinado de D. José I, de 1750 a 1777, apareceram as moedas de prata nos valores de 600, 300, 150 e 75 réis. Eram conhecidas como da "Série J", por trazerem em destaque a inicial do monarca. Cunhadas na Bahia e no Rio de Janeiro e destinadas ao resgate do ouro em pó, tiveram circulação restrita às comarcas mineiras. A moedagem de ouro no reinado de D. Maria I compreendeu duas fases: uma, de 1777 a 1786, em que a soberana aparece acompanhada de seu esposo, D. Pedro II, outra, de 1786 a 1805, após o falecimento do Rei, quando passou a ser retratada sozinha, com véu de viúva e, mais tarde, com toucado e jóias. As moedas de cobre que aqui circularam nessa época foram fabricadas pela Casa da Moeda de Lisboa. Em 1799, por economia de metal, o governo ordenou a redução de tais moedas à metade do seu peso. Tomando-se precário o estado de saúde da Rainha, seu filho, o Príncipe D. João, assumiu o governo em 1799, na qualidade de Príncipe Regente. As emissões com esse título, no entanto, começaram somente em 1802. A mudança da corte portuguesa para o Rio de Janeiro em 1808 acarretou grandes gastos. Isso levou-a a tornar medidas visando ao aumento das rendas e ao equilíbrio das finanças. Autorizou por exemplo a aplicação de contramarca nos pesos hispano americanos de 8 reales, aumentando o seu valor de 750 para 960 réis.

 

FOTO DE MOEDAS DE OURO

( Dinheiro do Brasil – Museu do Banco do Brasil)

 

 

A partir de 1810, como surgissem muitas falsificações de tais carimbos, aquelas moedas passaram a ser aproveitadas na recunhagem da nova moeda de prata de 960 réis, o chamado "patacão". Ainda em 1810, as moedas de prata da "Série J" passaram a receber um carimbo de "escudete" que lhes aumentava o valor, permitindo que circulassem por toda a colônia. Tal carimbo foi também aplicado nas antigas moedas de cobre, a fim de duplicar ­lhes o valor. O ano de 1811 marca o surgimento de um novo valor em cobre: o de LXXX réis. O valor máximo até então atingido por moedas desse metal tinha sido o de quarenta réis. A passagem do Brasil à condição de "Reino Unido a Portugal e Algarves", ocorrida em 1815, foi comemorada no ano seguinte, quando foram batidas em ouro, prata e cobre, as moedas da chamada "Série Especial". Entretanto, só a partir de 1818,com a aclamação e coroação de D. João VI (1818/1822), surgiram moedas com o título e as armas do Reino Unido. Nessa época, com circulação restrita a Minas Gerais, foram cunhadas, no Rio de Janeiro e Vila Rica, moedas de cobre de 75 e 37 1/2 réis para resgate dos bilhetes de permuta do ouro em pó. A moeda de 37 1/2 réis ficou conhecida como "vintém de ouro" por corresponder a 0,112 gramas daquele metal.

 

XICA DA SILVA, O FILME

 

O filme conta a história de Xica da Silva (interpretada por Zezé Motta) e acontece no século XVIII, em pleno ciclo da mineração. Xica era uma negra escrava, mucama das donas e brinquedo sexual dos senhores. Ela viveu no Arraial do Tijuco, Hoje conhecida como Diamantina. João Fernandes de Oliveira (interpretado por Walmor Chagas), o contador enviado por D. João I, por ela se apaixonou perdidamente e por conta desse amor foram cometidas as mais incríveis loucuras. Essas loucuras é que movimentam o filme. Dirigido por Cacá Diegues e tem a participação de um grandioso elenco. Lançado em 1975, ano em que o governo militar resolveu apoiar mais decisivamente o cinema brasileiro. Na época o diretor gostava que chamassem o seu trabalho de "o filme da abertura política", os críticos e jornalistas em geral não perdoaram a aproximação do diretor com o governo, nem as liberdades que ele tomou com a história do Brasil e com a raça negra, para tomar seu filme mais popular. De fato Chica da Silva atingiu em cheio o gosto do público e totalizou cerca de 3 milhões de espectadores, Cacá Diegues defendia-se das reclamações de carnavalização e de folclorização da nossa história, criando a expressão "patrulhas ideológicas" das quais ele seria a vítima principal. Felizmente esse tempo já passou e agora é possível formar uma visão mais objetiva do filme e de seus resultados culturais. Este filme colaborou para ampliar o interesse nacional pela arte e a cultura que nós herdamos dos africanos.

 

CENAS DO FILME: XICA DA SILVA

 

FOTO DE UMA CENA

 

Walmor Chagas como o contratador João Fernandes de Oliveira. Todo poderoso, dominava o monopólio de extração de riquezas, mal podia prever que se tornaria escravo de Xica. 6

 

FOTO DE CENA

 

O conde (josé Wilker) e Xica (zezé Motta). Criativa, mudou tudo ao seu redor, formando uma mini corte, com um brilho faustoso, ainda que provinciano. 7

 

FOTO DE CENA

 

Nenhum desejo de Xica deixou de ser feito jamais. Para servi-la havia uma multidão de mucamas e lacaios que a banhavam, vestiam e empoavam. Aqui a imagem mostra ao fundo o navio que o contratador mandou fazer para ela. 8

 

FICHA TÉCNICA DO FILME XICA DA SILVA:

 

Direção: Carlos Diegues

Produção: Jarbas Barbosa

Roteiro: Carlos Diegues e João Felício dos Santos, baseados num romance.

Diálogos: Carlos Diegues

Fotografia: José _edeiros

Música: Jorge Bem e Roberto Menescal

Instrumentos: Helvio Milito (percussão), Femando Lébeis (cantos populares). Montagem: Mair Tavares

Assistente de direção: Paulo Sérgio de Almeida.

Cenografia e Figurinos: Luiz Carlos Ripper.

Produtores executivos: José Oliosi e Aírton Correa.

Maquilagem e cabelos: Carlos Prieto

Produtor Associado: Embrafilme.

Elenco: Zezé _otta (Xica da Silva), Walmor Chagas (João Femandes de Oliveira), José Wilker (Conde), Stephan Nercessian (José), Elke Maravilha (Hortência), Altair Lima (Intendente), Rodolfo Arena (Sargento Mor), Marcos Vinícius (Teodoro), João Felício dos Santos (Padre), Rodolfo Arena (Comandante), Dora Kocy (Zefina).

Brasil, 1976 - 117 minutos - Cor.

Prêmios: Melhor Filme, Direção e Atriz no IX Festival de Brasília, 1976.

Melhor Diretor e Melhor Atriz pelo Prêmio Air France, 1976.

 

CONCLUSÃO

 

DE ESCRAVA A RAINHA.

 

Em 1763, começa a vigorar o contrato de extração de diamantes, ano em que a capital do Estado do Brasil foi transferida para o Rio de janeiro. O contrato arrematado pelo desembargador João Fernandes de Oliveira, filho do velho contratador de mesmo nome. Último a beneficiar-se deste sistema, suprimido com a criação da Real Extração em 1771, período em que é lembrado por dois motivos, o primeiro com o auge da extração de diamantes e o segundo, em que o Tijuco foi o cenário da extravagante glória de Chica da Silva. Tratada durante muito tempo como um capítulo a parte da História do Brasil, muitos só conhecem seu nome. Outros sabem pouco sobre ela e outros muitos nada sabem e nunca ouviram falar. O poder de um contratante e a importância das riquezas brasileiras para a Coroa e seu peso na formação de estruturas sociais é refletido na história da vida de Chica. Seiscentos escravos acima do permitido por lei era um número bem superior que João Fernandes mobilizava. Junto com Chica da Silva e extremamente poderosos, conforme determinações legais da época, não tinham preocupações referentes a terras alheias e chegaram a permitir que a venda dos diamantes fosse feita as claras. Mas quem realmente mandava nele, por certo, não era a Coroa, e sim, a mulata, Chica. Não era bonita, conforme pesquisas, mas tinha inegável poder de seduzir todos os homens. Alta, com a cabeça raspada, corpulenta, usava uma peruca de cachos. Surgiu como escrava de José da Silva e Oliveira, pai do padre Rolim, um dos inconfidentes. Declarada e assumida amante de Rafael Pires Pardinho, na época, primeiro intendente do Distrito Diamantino, com este teve dois filhos. Um deles, Simão Pires Pardinho, estudou em universidades européias e conseguiu ocupar importantes cargos na Corte. Já com João Fernandes de Oliveira, Chica da Silva teve treze filhos, legitimados e um dos quais, herdeiro do mesmo nome do pai, tomou-se muito rico. A rigidez das práticas da administração, durante a atuação de João Fernandes, foi temperada pelo clientelismo que se fez em tomo da ex-escrava. Sua vontade abria portas mas não era gratuita, pois todos os desejos dela, ele realizava. Cita-se como por exemplo o navio que construiu para ela, que queria ver o mar, abrindo uma brecha em sua chácara para fazer um lago para Chica navegar. 

 

O lugar onde viviam era como um pequeno reino com direito a castelo e tudo, ornamentado com árvores européias e um teatro que era o único do Tijuco. Respeitada também pela igreja, que no início fechava as portas para ela, possuía até mesmo lugares reservados para si, seus filhos e mucamas. João Fernandes mandou erguer a igreja da Ordem Terceira do Carmo somente para ela, diante da casa em que viviam. Acabou tendo de romper por causa da discórdia causada pela irmandade, mas não desistiu da idéia, assumindo todos os gastos da construção. Uma série de inimigos o contratador ganhou, não sem razão. Muita ostentação e diversas infrações dos regulamentos. Com isso acabou chegando denúncias aos ouvidos do rei de Portugal, que mandou ao Brasil D. José Luíz de Meneses, conde de Valadares e governador da capitania de Minas. Obrigado a visitar o desembargador, hospedou-se na casa de Chica, que suspeitou de suas intenções. Para acalmá-lo, servia-lhe em cada refeição uma terrina cheia de lâminas de ouro. Mas nada pode desviar o governador do que viera fazer. O desembargador teve que voltar ao reino e nunca mais teria permissão para voltar, embora houvesse pago toda a multa à Coroa.

 

É muito chato fazer uma crítica a pessoas que trabalham bem, mas para os historiadores é muito mais importante ter segurança com fatos históricos citados ou utilizados em pesquisas para filmes, documentários, livros ou qualquer outro trabalho que envolva a história da humanidade e de seus acontecimentos, que firmar-se em um filme. Em "Xica da Silva" de Cacá Diegues, por exemplo, é citado como rei de Portugal D. João I, mas na verdade, naquela época quem realmente reinava era D. João V, rei de Portugal de 1706 até 1750. Nasceu em 1689 e morreu em 1750. Vivo, inteligente, apaixonado pela grandeza, o fausto e as mulheres. Generoso e muito religioso, construiu o convento de Mafra, uma das maiores obras arquitetônicas da Europa. Teve esmerada educação, destacando-se nas línguas e nas ciências. Em seu reinado, foram abertos os primeiros caminhos do Rio Grande do Sul. Em 1737, enviou Silva Paes para fundar Rio Grande, dando início à ocupação do Rio Grande do Sul. No ano de 1750, pelo Tratado de Madrid, as Missões dos Sete Povos foram incorporadas ao Rio Grande do Sul. Também foi o iniciador da colonização com casais açorianos. Em troca das missões cedeu a Colônia do Sacramento à Espanha.

 

Voltando aos filhos de Chica da Silva, parece que no filme não daria para confiar, nem sequer os mencionam. Porque filhos, isso ela lhos deu muitos. Uma récua, nada menos de treze: João, Antônio, José, Joaquim, Francisca, Rita, Ana, Helena, Luiza, Maria, Quitéria, Mariana e Antônia, além dos dois que trouxe quando iniciou a mancebia, e que eram filhos do Dr. Manuel Pires Sardinha. Um deles é o célebre Dr. Simão Pires Sardinha, com o qual o desembargador gastou fortunas colossais para educá-lo, fazendo-o correr a Europa com ampla autorização de gastar. A parte final do filme nada tem a ver ao que acontece com Chica da Silva. Seu sofrimento pela perda de João Fernandes foi natural e normal, mas e o que foi feito dela – depois ? Chica morreu afogada em ouro, dando fidalgos a Portugal, permanecendo para a eternidade na memória do povo. Além destes, o filme apresenta outros erros históricos e defeitos gravíssimos de pesquisa. Historicamente não pode ser utilizado como fonte, mas pode ser comparado com fontes verdadeiras proporcionando um ótimo exercício crítico.

 



¹ Intendências de Minas era o órgão responsável pela administração municipal nas áreas de mineração. BELLOMO, Harry Rodrigues, 1998, pág. 20.

² LUNA, Francisco Vidal, 1981, pág. 15.

³  BELLOMO, Harry Rodrigues, 1998, pág. 7.

4 Brasil 500 anos, 2000, pág. 229.

5 Idem,  nota 4.

6 ISTO É, Cinema Brasileiro, s/data, pág. 8.

7 ISTO É, Cinema Brasileiro, s/data, pág. 9

8 ISTO É, Cinema Brasileiro, s/data, pág. 8


Por Vanessa Candia.

História do Brasil.

Nenhum comentário:

Postar um comentário