quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Crinolina: a moda que causou a morte de muitas mulheres no século XIX.

 No século XIX, enquanto o traje masculino se simplificava para um terno de quatro peças (calça, camisa, colete e paletó), a roupa feminina foi no sentido inverso. Para corresponder ao ideal de beleza da época, a moda se tornou cada vez mais complicada, torturante e espaçosa: busto levantado, cintura apertada ao extremo pelo espartilho e quadris enormes obtidos com armações sob o tecido para aumentar o tamanho das saias.

Foi a época da crinolina, a armação para saias surgida na década de 1830 e usada nos cinquenta anos seguintes. A palavra crinolina vem do francês, uma junção de crinis e linum, “crina de cavalo” e “linho”, respectivamente, os materiais usados para confeccionar a anágua em forma de gaiola. Mais tarde, foram empregados outros materiais (como aros de aço, vime e até pneus de bicicleta!) mas o termo continuou sendo usado para chamar a armação.

A crinolina era uma armação em formato de gaiola, usada pelas mulheres para ampliar a saia dos vestidos.

As primeiras crinolinas eram feitas de tiras de linho engomado e crina de cavalo. Depois foram empregados aros de aço, vime e outros materiais.

A evolução da crinolina

A moda de saias imensas já existia antes da invenção da crinolina. Para conseguir o efeito desejado, a mulher usava outras saias engomadas por baixo. Duas ou três no início, mas a competição pela saia mais rodada levou a acrescentar mais saias internas… até 14! Tantas peças de roupa dificultavam a caminhada e eram insuportáveis no verão.

A invenção da crinolina aliviou o peso e o calor sufocante do traje feminino. A moda da crinolina se consolidou a partir de 1840 e rapidamente foi adotada mulheres de todos os níveis sociais no Ocidente e até no Japão da Era Meiji.

A saia atingiu sua largura máxima na década de 1860 chegando a 2 metros-2,5 metros de diâmetro, equivalente à largura de um Volkswagen Gol!  O escritor francês Alphonse Karr escreveu sobre isso:

“Duas mulheres não ficam mais juntas nas poltronas de um camarote no teatro, nem em uma carruagem. Cinco mulheres sentadas por perto não podem conversar confidencialmente porque estão separadas pela amplitude de suas saias; elas têm que gritar. Um homem sentado entre duas mulheres desaparece.”

Depois a saia começou a inclinar para a parte de trás deixando-a achatada sobre o estômago. Isso deu à saia uma formato mais piramidal.

Para não mostrar as pernas em uma rajada de vento, as mulheres passaram a usar calças de algodão até o calcanhar. As mais elegantes usavam linho ou seda terminadas com renda na bainha.

Na década de 1870, nova mudança: a crinolina reduziu de diâmetro e entrou em cena a crinolete, uma armação que dava mais volume nas nádegas. Com a cintura apertada no espartilho, a crinolete dava ao corpo da mulher um contorno mais curvilíneo. Logo surgiu outra inovação: o bustle feito de tecido pesado e também para aumentar o traseiro.

Crinolina com crinolete (à esquerda) e o bustle (à direita): recursos para dar volume no traseito.

A crinolete variava de formato e de material, mas sempre com o objetivo de aumentar a parte traseira do vestido. As modistas aproveitavam para aplicar laços, babados, franzidos e faixas nesse espaço.

Habilidades e cuidados para usar a crinolina

Usar a crinolina exigia habilidade. Para andar era preciso manter o tronco inclinado para a frente para não balançar a armação dando uma aparência desajeitada e balofa.

Para sentar, muita atenção para não errar o assento: sentava-se na borda da poltrona e rapidamente dobrava-se a saia sobre si mesma, caso contrário, ela subiria descobrindo as pernas.

Passar pelas portas (a arquitetura das novas casas foi modificada para adaptar-se às crinolinas), entrar na carruagem… tudo no dia-a-dia ficou complicado com aquela moda espaçosa.

Regras foram impostas para conduzir as senhoras nos ónibus e carruagens de aluguel: elas tinham de deixar a crinolina do lado de fora do veículo. Caso contrário, era impossível acomodar mais passageiros.

“Nova regra para o ônibus”: para entrar no veículo, a mulher tem que deixar sua crinolina para fora. Charge inglesa, 1858.

Crinolinas femininas são carregadas do lado de fora de um ônibus, em Londres. Foto de 1860.

Acidentes mortais com a crinolina

A crinolina podia, também, ser mortal. Em uma época na qual o fogo estava presente nas lareiras, cozinhas e iluminação à vela, era elevado o risco de incêndio. A mulher precisava calcular a área ocupada pela saia ao se aproximar de uma chama evitando incendiar a saia.

Foram numerosos os casos de saias queimadas. Em 1858, o jornal The New York Times publicou uma matéria alertando para o perigo dessas roupas. Afirmava que elas causavam uma média de três mortes por semana.

A jovem mulher ocupada em se ver no espelho não percebe que seu vestido aproximou-se muito da lareira e pegou fogo. Muitas mulheres morreram queimadas dessa maneira.

Em julho de 1861, o poeta americano Henry Wadsworth Longfellow teve que correr para ajudar sua esposa quando o vestido dela pegou fogo. Segundo relato do Boston Daily Advertiser, ela estava “sentada na biblioteca quando um fósforo, ou um pedaço de papel em chamas, atingiu seu vestido, incendiando-o em um instante”. A mulher faleceu no dia seguinte.

Duas meias-irmãs do escritor Oscar Wilde também morreram em decorrência de queimaduras por ficarem muito perto de uma lareira com seus vestidos armados com crinolina.

O caso mais terrível ocorreu em 8 de dezembro de 1863, quando mais de 2.000 pessoas morreram na igreja da Companhia de Jesus em Santiago do Chile. Uma vela causou o incêndio no altar que se espalhou rapidamente. A tragédia ocorreu quando as pessoas em pânico tentaram fugir mas isso se tornou quase impossível com as crinolinas.

Durante a Guerra Civil Americana (1861-1865), as mulheres do Sul esconderam sob seus vestidos armas e mercadorias contrabandeadas contornando, assim, a proibição da União de levar mercadorias para os estados confederados.

Vestir-se era uma operação complexa para a mulher do século XIX. Depois da crinolina vinham muitas peças de roupas e era preciso a ajuda de criadas.

O filme “E o vento levou” (1939) ambienta-se na década de 1860 nos Estados Unidos, época do apogeu da moda feminina da crinolina. As atrizes tiveram que treinar para se movimentarem com graça nesses vestidos tão amplos.

A moda na década de 1870 era o vestido com frente plana e todo volume no traseiro, o que era obtido com o uso da crinolete.

Fonte

  • MARCHETTI, Ada Gigli. Dalla crinolina alla minigonna: la donna, l’abito e la società dal diciottesimo al ventesimo secolo. Bologna, Itália: CLUEB, 1995.
  • LAVER, James. Breve historia del traje y la moda. Espanha: Ediciones Cátedra, 1988.
  • Crinolines Fashion History. Fashion-Era.
  • Crinolina. Encyclopaedia Britannica.

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