Artigo 331 do Código Penal. - Decreto Lei nº 2.848 de 07 de
Dezembro de 1940
STJ decide:
Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela continua
a ser crime!
Desacatar funcionário público
no exercício da função ou em razão dela continua a ser crime, conforme previsto
no art. 331 do Código Penal.
STJ. 3ª Seção. HC 379.269-MS, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, Rel. para acórdão Min. Antônio Saldanha Palheiro, julgado em
24/5/2017 (Info 607).
Previsão do desacato no direito brasileiro
Art.
331. Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
Desacatar significa "menosprezar a função pública exercida por
determinada pessoa. Em outras palavras, ofende-se o funcionário público com a
finalidade de humilhar a dignidade e o prestígio da atividade
administrativa." (MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. 4ª ed., São
Paulo: Método, 2014, p. 748).
O bem jurídico protegido é o respeito da função
pública. Tanto isso é verdade que a vítima primária deste delito é o Estado. O
servidor ofendido é apenas o sujeito passivo secundário.
O Brasil é signatário da Convenção Americana de
Direitos Humanos, que ficou conhecida como "Pacto de São José da Costa
Rica".
Neste tratado internacional,
promulgado pelo Decreto nº 678/92, foi previsto como um dos direitos ali consagrados a liberdade de
expressão. Confira:
Artigo
13. Liberdade de pensamento e de expressão 1. Toda pessoa tem direito à
liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de
buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem
consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou
artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha. 2. O exercício do
direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia,
mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela
lei e ser necessárias para assegurar: a. o respeito aos direitos ou à reputação
das demais pessoas; ou b. a proteção da segurança nacional, da ordem pública,
ou da saúde ou da moral públicas. 3. Não se pode restringir o direito de
expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais
ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de
equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer
outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.
4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo
exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da
adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2. 5. A lei deve proibir toda
propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial
ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime
ou à violência.
Há muitos anos, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) vem
decidindo que a criminalização do desacato contraria o artigo 13 do Pacto de
San José da Costa Rica. Em 1995, a Comissão afirmou que as leis de desacato se
prestam ao abuso, como meio para silenciar ideias e opiniões consideradas
incômodas pelo establishment, bem assim proporcionam maior nível de proteção
aos agentes do Estado do que aos particulares, em contravenção aos princípios
democrático e igualitário (CIDH, Relatório sobre a compatibilidade entre as
leis de desacato e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, OEA/Ser. L/V/II.88,
doc. 9 rev., 17 de fevereiro de 1995, 197-212).
Em 2000, a CIDH aprovou a Declaração de Princípios
sobre Liberdade de Expressão, onde reafirmou sua posição sobre a invalidade da
tipificação do desacato:
"11.
Os funcionários públicos estão sujeitos a um maior controle por parte da
sociedade. As leis que punem a manifestação ofensiva dirigida a funcionários
públicos, geralmente conhecidas como 'leis de desacato', atentam contra a
liberdade de expressão e o direito à informação."
Em suma, para a CIDH, as leis de desacato restringem indiretamente a
liberdade de expressão, porque carregam consigo a ameaça do cárcere ou multas
para aqueles que insultem ou ofendam um funcionário público. Por essa razão,
este tipo penal (desacato) é inválido por contrariar o artigo 13 da Convenção
Americana de Direitos Humanos.
A jurisprudência do STJ acolhe esta tese? O
desacato deixou de ser crime no ordenamento jurídico brasileiro por força do
Pacto de San Jose da Costa Rica?
NÃO. Desacatar funcionário público no exercício da
função ou em razão dela continua a ser crime, conforme previsto no
art. 331 do Código Penal. STJ. 3ª Seção. HC 379.269-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca,
Rel. para acórdão Min. Antônio Saldanha Palheiro, julgado em 24/5/2017 (Info
607).
Desacato não viola a liberdade de expressão A
figura penal do desacato não prejudica a liberdade de expressão, pois não
impede o cidadão de se manifestar, “desde que o faça com civilidade e
educação”.
A responsabilização penal por desacato existe para
inibir excessos e constitui uma salvaguarda para os agentes públicos, expostos
a todo tipo de ofensa no exercício de suas funções.
Houve uma decisão do STJ neste sentido no final de 2016:
O
crime de desacato não mais subsiste em nosso ordenamento jurídico por ser
incompatível com o artigo 13 do Pacto de San José da Costa Rica. A
criminalização do desacato está na contramão do humanismo, porque ressalta a
preponderância do Estado - personificado em seus agentes - sobre o indivíduo. A
existência deste crime em nosso ordenamento jurídico é anacrônica, pois traduz
desigualdade entre funcionários e particulares, o que é inaceitável no Estado
Democrático de Direito preconizado pela CF/88 e pela Convenção Americana de
Direitos Humanos. STJ. 5ª Turma. REsp 1640084/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas,
julgado em 15/12/2016.
Este precedente (a favor da descriminalização) foi da 5ª Turma e o
segundo acórdão (mantendo o crime) foi prolatado pela 3ª Seção.
No STJ, existem duas Turmas que julgam normalmente
os processos que envolvem matéria criminal: 5ª e 6ª Turmas. Cada Turma possui 5
Ministros. Determinados processos (ex: embargos de divergência) são julgados
pela 3ª Seção, que é a reunião dos Ministros da 5ª e 6ª Turmas. É também
possível que o Ministro Relator proponha que determinado processo que seria
julgado pela Turma seja, em vez disso, apreciado pela Seção. Isso ocorre
normalmente quando o tema é polêmico e se deseja uniformizar o assunto. Foi isso
o que aconteceu no caso concreto. Havia uma decisão da 5ª Turma dizendo que
desacato não seria crime. O tema, contudo, ainda não estava pacificado no
âmbito do STJ. Diante disso, o Ministro Relator do HC 379.269/MS, que também
tratava sobre esse mesmo assunto, entendeu mais prudente levar o processo para
ser apreciado pela 3ª Seção, que decidiu em sentido contrário ao precedente da
5ª Turma.
Como exemplos mais comuns de desacato
dentro da jurisprudência temos:
- insultar ou estapear o funcionário;
- palavras de baixo calão;
- agressão física;
- brandir arma com expressões de desafio;
- tentativa de agressão física;
- provocações de escândalo com altos brados;
- expressões grosseiras;
- caçoar do funcionário;
- gesticulação ofensiva;
- gesticulação agressiva;
- rasgar ou atirar documentos ao solo.
O delito de desacato está previsto no
capítulo que trata dos crimes praticados por particulares contra a
administração pública. Trata-se de um crime comum, e pode ser praticado por
qualquer pessoa. O bem jurídico em questão neste ilícito é o interesse em se
assegurar o normal funcionamento do estado, de modo a garantir o prestígio do
exercício da função pública. A proteção se refere mais à função pública do que
a própria pessoa do funcionário.
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