domingo, 8 de dezembro de 2019

Amurians e as destemidas guerreiras da Amazônia antiga.

AMURIANS E AS DESTEMIDAS GUERREIRAS DA AMAZÔNIA ANTIGA

No período pré-colonial, a foz do Amazonas era repleta de grupos nativos — possivelmente liderados por chefias femininas
JOSEANE PEREIRA PUBLICADO EM 08/12/2019
Braço do rio Amazonas na fronteira entre Brasil e Colômbia
Braço do rio Amazonas na fronteira entre Brasil e Colômbia - Getty Images
No ano de 1540, um grupo de espanhóis realizou uma das expedições mais ousadas da História. Com o objetivo de encontrar a fantasiosa cidade de El Dorado, os conquistadores Gonzalo Pizarro e Francisco de Orellana, junto ao padre dominicano Frei Gaspar de Carvajal e outros, resolveram atravessar a floresta Amazônica desde Quito, nos contrafortes andinos, até a foz do grande rio.
Apesar de não terem encontrado a cidade dourada, os espanhóis que adentraram naquela desconhecida floresta acabaram se deparando com aldeias indígenas gigantescas por toda a foz do Amazonas, e milhares de nativos — em sua maioria, mulheres — prontos para defender suas terras.
TERRITÓRIO DE AMURIANS
Em junho daquele ano, a expedição navegou pelo espaço governado pela chefe nativa Amurians (a Grande Chefe). “Na primeira tentativa de desembarcar para conseguir comida, eles mereceram um ataque tão feroz que tiveram de disputar cada centímetro de chão até conseguir voltar aos barcos, onde uma esquadra de canoas já os cercava”, afirma o historiador Márcio Souza, autor de “História da Amazônia: Do Período Pré-Colombiano aos Desafios do Século 21”.
Primeira rota da viagem de Orellana e Carvajal, 1541-1542 / Crédito: Wikimedia Commons

E o mais inesperado nos relatos do frei Carvajal era que seus adversários eram compostos por muitas mulheres guerreiras. Altas, com longos cabelos amarrados em tranças e vestidas apenas com tangas, elas seriam uma visão espantosa para o grupo de cristãos europeus.
O próprio cronista foi vítima do exército feminino: Carvajal recebeu uma flechada na coxa e outra nos olhos. Mas sobreviveria para contar a história — aliás, viveria até os 80 anos, com disposição para retornar da Espanha ao Peru, onde ocuparia postos importantes na Igreja local.
HISTÓRIA AMPLIADA
Objetos de arqueologia amazônica, com possíveis representações femininas / Crédito: Divulgação/Viramund

Quando os homens de Orellana conseguiram capturar um indígena daquela região, não perderam tempo em pedir explicações sobre as mulheres. E, por motivos que desconhecemos (talvez o medo da morte, ou desejo de enganar os invasores europeus), o indígena contou uma fantástica história: as mulheres guerreiras realmente tomavam conta da região, vivendo somente entre elas em aldeias feitas de pedra.
Quando precisavam de homens, atacavam os grupos vizinhos e capturavam os mais aptos à guerra, para ajudá-las nos combates ou ter relações sexuais. Afinal, a aldeia precisava de novas gerações de guerreiras. E, quando alguma dava à luz, caso a criança fosse menina, seria criada e treinada para a luta. Se menino, poderia ser morto na hora.
Hoje sabemos que construções de pedra eram inexistentes na Amazônia antiga. Entretanto, arqueólogos têm encontrado muitos objetos de cerâmica — como urnas funerárias, cachimbos e pequenas estátuas — que confirmam a possibilidade de sociedades matriarcais, com mulheres sendo grandes líderes militares e espirituais.
E aquele grande rio, que na época da expedição era conhecido como Mar Dulce, acabaria sendo batizado de Rio das Amazonas.

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